quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Panorama do mercado brasileiro

Discurso pronunciado por Roberto Moreira quando tomou posse no cargo de presidente do sindicato dos produtores – Sindicato da Indústria Audiovisual do Estado de São Paulo (Siaesp) – a 15 de dezembro de 2009:

De um lado temos todas as condições macro-econômicas para dar um grande salto industrial na nossa produção. Pela primeira vez, estamos num ambiente econômico estável, com taxas de juros declinantes, pré-condição para um investimento de alto risco e amortização lenta como o cinema. O fenômeno da integração na classe média de grandes contingentes da população também cria a expectativa de uma rápida expansão do gasto com entretenimento. Por fim, contamos com vários mecanismos de investimento e um compromisso claro das diversas esferas de governo com o sucesso do audiovisual brasileiro.

Por outro lado, no dia a dia da produção, enfrentamos problemas estruturais de difícil solução. Nossos custos são altos, o que mina a competitividade do nosso mercado de prestação de serviços de produção e dificulta muito fechar o financiamento de um produto. As empresas também não conseguem realizar um planejamento estratégico, reféns que estão de diretores de marketing e comissões de seleção. Por fim, e mais letal, o processo de captação é lento e fragmentado, o que inviabiliza financeiramente as produtoras e as torna eternamente descapitalizadas, lutando para levantar recursos mês a mês.

É preciso que a atividade produtiva seja incentivada e valorizada. Somos o elo mais fraco da cadeia. No caso do cinema, o exibidor tem sua renda, ainda que pequena, garantida. O distribuidor ganha no volume. Já o produtor aposta seu futuro a cada filme. No caso da TV, as emissoras geralmente pagam pouco, quando não pedem para você pagar o espaço de veiculação. Responsável pela qualidade dos produtos em torno dos quais gira toda a indústria, o produtor é o primeiro a investir tempo e dinheiro num projeto, e o último a ser remunerado, sendo que só excepcionalmente consegue aferir algum resultado.

Como fortalecer o nosso setor? Como nos preparar para essa nova realidade econômica que está chegando? E como o Sindicato pode ajudar nesse processo?
Uma primeira missão é compreender a realidade econômica de nossa atividade. Infelizmente temos poucos dados e quase nenhuma análise. Precisamos produzir conhecimento sobre a economia do audiovisual. Nesse sentido, já começamos uma série de pesquisas que virão pautar as iniciativas dessa diretoria. Temos que superar os achismos e discutir políticas públicas em cima de dados e da realidade econômica da atividade.

Urge desenhar mecanismos de financiamento que capitalizem as produtoras e lhes deem a chance de efetivamente tomar decisões de investimento e de planejamento a longo prazo. A discussão desses mecanismos será uma das prioridades desta gestão. O produtor tem que ser uma agente econômico com voz ativa e capacidade de investimento, não um mero "captador".

Por fim, teremos que fazer uma grande mudança cultural, principalmente no caso do cinema. 35 anos de paternalismo estatal geraram um setor pouco preparado para os rigores do mercado. Cada vez mais o cinema deixará de ser visto como uma ocasião de expressão pessoal, para se tornar produto negociado num mercado. Esta transição é inevitável se queremos de fato consolidar uma indústria do audiovisual.

Só que nesse processo não podemos sacrificar a diversidade. Todo filme é, ao mesmo tempo, obra de arte e mercadoria. Uma cinematografia forte precisa valorizar essas duas dimensões e respeitar suas características. O mercado cinematográfico é segmentado e diferencia o chamado "filme de arte" daquele com grande potencial comercial. No entanto, nossos mecanismos de financiamento ignoram essas diferenças e vivemos uma situação um pouco esquizofrênica, na qual o filme de arte é cobrado pelo seu público pequeno e o filme comercial é produzido a fundo perdido, sem nenhum risco. Colocar ordem na casa vai deixar os dois setores mais fortes.

Mas não são só os produtores que vão ter que mudar de atitude. Também o Estado vai ter que mudar. Se nossos gestores querem que a atividade econômica aconteça com pujança, vão ter que dar dois passos atrás e conferir maior liberdade aos agentes econômicos. Paternalismo e empreendedorismo não combinam.

Este é um discurso otimista, mas queria finalizar lembrando que, entre os gabinetes e a dura realidade do dia-a-dia da cultura, existe um abismo radical. Já vivemos vários sonhos grandiosos que fracassaram - basta lembrar da Vera Cruz e da Embrafilme. Mesmo a Lei do Audiovisual, na época, ia ser uma revolução ..

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